quarta-feira, setembro 12, 2007

"semelhante a essas flores reticentes, em si mesmas abertas e fechadas" *

Ele telefonou. Era o curso da vida que seguia, imune, por mais que houvesse uma força pronta a desmanchar aquele mundo. Ela disfarçou, fingiu não saber quem era. "Quem é?". Ele tinha a consciência de que aquele aparelho reconhecia as chamadas. Ela sempre atendera alegre, comprovando o funcionamento daquela ferramenta agora tão insuportável e julgadora. Ela era a Ré. Ali, com o aparelho na mão e coração pulando no peito.
Impossibilitada de fugir. Ele tinha um presente pra ela. Ela não queria um presente. Não queria saber de mais nada. Ele sabia que estava tudo abalado. Encontraram-se na porta. Ele entregou o presente. Era difícil ainda assimilar o rompimento. Ela sorriu, sentiu-se feliz. De verdade. Ele lembrara dela.
Mesmo que um sentimento de não envolvimento pleno fosse grande por parte dela, ainda havia aquela sensação tépida das relações em processo de finalização. Ele deu um beijo no rosto dela e depois a abraçou. Nunca haviam tocado os seus lábios, entretanto, os momentos que trocaram eram mais fortes que qualquer beijo. Acabaram ficando sem jeito. Ela precisava voltar pra sala. Ele precisava ir pra casa. Despediram-se. Sabiam que ao darem as costas um para o outro estariam cortando os últimos fios da ligação ali existente. Pelo menos aqueles fios que antes pareciam tão importante pra ambos.

* o título é um trecho do poema "A máquina do mundo" do Carlos Drummond de Andrade.

6 comentários:

Thalita disse...

Ai Gabi, caramba...fiquei emocionada lendo assim, me veio a cena toda na cabeça. Ai.

E esse título então, é de matar. Lindo. =)

tenho umas coisas chatas a contar, sabe, quero escrever pra vocês a noite. Espero que esteja tudo bem, florrr!

beijo, beijo.

Anônimo disse...

Ah, lindo!!
E de fato, propício como só esse texto poderia ser.

Como já posso ter saudades de vocês??

A próxima sessão é de Ayahuasca e chás de cogumelos hein? =P

Anderson Lucarezi disse...

Ah, não posso ler essas coisas.
Pode até acontecer de os meus olhos lacrimejarem.
um beijo no coração,

Luca.

Anônimo disse...

Sobre a Virginia Woolf, LEIA!
É pequeno, a leitura é rapidíssima, tô adorando.
=*

D ... disse...

ai... fico desperadamente emocionada, do lado de c�. um carinho que chega at� aqui. ah, que amorzim!

Unknown disse...

Nossa, gabi...rs, agoira vou escrever algo que vc me escreve: Parece que vc escreveu pra mim. Que cena linda.
Um conto de palavras cabais, todas muito exatas, muito cheias de proposito, cada uma delas, nenhuma escrita sem alguma intenção. Um conto cortante, lindo, lindo mesmo!!

beijão!