terça-feira, agosto 21, 2007

Viver é arriscado demais!

Não se canse com isso aqui! Não leia ! Não perca seu precioso tempo! Eu não sei de nada, aliás, nunca soube. E está aqui o grande problema. Enquanto tudo gira rápido, eu fico perdida entre os transeuntes, que me roubam olhares-sorrisos-palavras-pensamentos-sonhos. Eles nem imaginam que eu os tenho. Que aqui dentro dessa cachola pensante existe um mundo além do meu mundo real. E só de olhá-los eu posso ver as minhas representações quase que instantaneamente. Eu atuo, sim, fazendo o que as pessoas fazem na rua, na televisão, nas músicas...a diferença é que ninguém vê. Até aí não tem problema, porque eu me divirto um tantão.
Difícil é você perceber que esse mundo se torna superior ao seu mundo real. E que você acha bem mais bonitinho atuar. Tem algum problema aqui. É claro! Mas se você atua pra você mesmo, não há como se sentir tão culpada, porque você não precisa pensar nos outros personagens. Eles apenas fazem parte do enredo, você os dá vida e os mata quando achar necessário. Eles podem ser reflexos daqueles da vida real, ou muito bem inventados, exatamente como todo mundo devia ser.
As coisas se complicam quando você passa a misturar o mundo real com o seu mundo de representações e não consegue mais dissociar as imagens dos dois mundos. Elas parecem apenas reais, ambas. Aí você fica confusa, porque uma hora parece que é uma coisa e noutra hora parece que ela já não é mais.Está desconfigurada, maqueada, transformada. Não só as pessoas. Os sentimentos, as verdades, as formas, as cores.
É...viver é arriscado demais. Alguém tem chocolate e um poquinho de Lexotan pra me dar?

quinta-feira, agosto 09, 2007

MAGMA

Este não é um texto sobre matéria fundida, muito menos sobre a atividade tectônica e suas implicações. É que andei lendo Magma do João Guimarães Rosa e estou extremamente encantada. Os Hai-Kais. Imensidão. Egoísmo. Infinito.Turbulência. Eu andei com ele pela Gruta do Maquiné. Juro. Mas no final eu me deparei com o enorme olho frio me vigiando. Resolvi ver o Luar na Mata, porque lá as corujas chegavam vestidas de seda. E, quando me cansei, fui experimentar o Desterro. Então, vi o homem que ia já longe, como quem só tem costas. Aí Riqueza. Distância sentimental."Mesmo a sonhar contigo, só consigo que me ames noutro sonho dentro do meu sonho primitivo". Música de Schubert. Ausência, como a daqueles outros poetas que eu sempre gosto tanto. Ausência minha, deles. Nossa. Paraíso filosófico."Como se os dedos mergulhassem a tranlucidez de uma água, esculpindo invisíveis e impossíveis formas novas". E termino diferente. Embora bonita a Consciência Cósmica. Prefiro encerrar a viagem na Primavera da Serra:


Claridade quente da manhã vaidosa.
O sol deve ter posto lente nova,
e areou todas as manchas,
para esperdiçar a luz.

Dez esquadrilhas de periquitos verdes
receberam ordem de partida,
deixando para as araras cor de fogo,
o pequizeiro morto.
E a árvore, esgalhada e seca, se faz verde,
vermelha e castanha, entre os mochoqueiros,
braúnas jatobás e imbaúbas do morro,
na paisagem que um pintor daltônico
pincelou no dorso de um camaleão.

E o lombo da serra é tão bonito e claro,
que até uma coruja,
tonta e míope na luz,
com grandes óculos redondos,
fica trepada no cupim, o dia inteiro,
imóvel e encolhida, admirando as cores,
fatigada, talvez, de tanta erudição....


* Agradeço ao G. o empréstimo desse livro de esplêndida poesia!